"Portuguesmente falando" Jarosław Kaczyński teve recentemente um "ataque de caspa" no Parlamento polaco, o Sejm. Nada como aquela expressão idiomática portuguesa para expressar o zeitgeist do momento neste país da Europa Central. Desde o passado Domingo os protestos da oposição são diários contra a intenção do partido PiS (Lei e Justiça) em tomar o controlo absoluto do Surpremo Tribunal, i.e, passando leis que impedem o mesmo de as tornar anticonstitucionais.
O partido no poder não abdica desta decisão e só o Direito de Veto presidencial poderá reverter tudo, o problema é que o Presidente foi eleito pelo PiS...
A cartada final seria se o PiS conseguisse ter o Ministro da Justiça a nomear - e evidentemente a demitir - os juízes do Surpremo Tribunal. O argumento de Kaczyński é o de existirem elementos da outrora "PRL" ou República Popular da Polónia na dita instituição; os infiltrados, os "comunas", a "esquerdalha" como assim são adjectivados.
A situação revela-se de tal forma grave que a UE considera sanções para a Polónia, nunca antes vistas, caso o PiS vá para a frente com esta decisão. A sanção mais grave porventura, será cancelar o direito de voto da Polónia a nível do Parlamento Europeu o que levou outro polaco, Donald Tusk, o Presidente do Conselho Europeu, a pedir uma reunião de emergência com o Presidente em funções.
Andrzej Duda, o Presidente da República, está debaixo de uma pressão imensa. Por um lado a sua lealdade a Jarosław Kaczyński e por outro o possível Direito de Veto, que só este tem, em impedir esta alteração de raiz à constituição da Polónia. Está neste momento nas mãos do Presidente Duda ficar na História da Polónia como herói ou como vilão, ainda que isto varie proporcionalmente a quem ficará afectado com o sim ou o não do veto...
A oposição reuniu-se hoje em frente do Palácio Presidencial em Varsóvia, na charmosa Stare Miasto da capital, para um protesto monumental (dizem mais de 50.000 almas apenas em Varsóvia e outras tantas nas grande urbes). Facto referido em rodapé pelo canal estatal TVP - e em números muito menores - (canal esse agora jocosamente denominado de TVPiS...) mas amplamente noticiado pelos meios de comunicação social sem associações ao partido no poder ou por aqueles ligado à oposição.
Membros da oposição conhecidos do grande público, o Ex-Director do Tribunal Constitucional, Adam Strzembosz, idoso mas muito lúcido, discursaram com argumentos sólidos e entre palavras de ordem como "Oposição Unida!", "Polónia livre e Europeia!" e outros claramente provocatórios como denominarem o PiS de "Comunas" pela galopante censura e perseguição à oposição bem como o recurso ás autoridades para prenderem e levarem a braços manifestantes... A recordar protestos do passado como aqueles nos anos 80, em especial os que levaram ao colapso do regime Comunista-Socialista em 1989 e a posterior implementação da Democracia na Polónia.
Pela voz da ala dura do PiS e fidelisima a Jarosław Kaczyński, como a Primeira-Ministra Szydło, a opinião pública é inundada, sobretudo através do canal TVP, com mensagens patrióticas a relacionarem os protestos como falta de sentido patriótico, obediência cega à elite da União Europeia, que de acordo com o PIS, interfere com os assuntos e política interna da Polónia, e manobras de bastidores dos resquícios do "ancient règime", deposto, entre outros, por os irmãos Kaczyński.
Neste caldeirão, actual e em desenvolvimento, o líder do PiS, teve o dito "ataque de caspa" no Parlamento, mostrando-se lívido e agressivo com os protestos e com a movimentação da oposição. Visivelmente transtornado o político disse alto e em bom som (sic):
"Não limpem os vossos focinhos de traidores com o nome do meu falecido irmão. Vocês destruíram-no, vocês mataram-no! Vocês são a escória!"
A reacção não se fez esperar... Entre apupos e acusações a oposição foi peremptória em afirmar que Kaczyński finalmente deixou cair a sua máscara de hipócrita e vingativo. Será este o leit motif por trás da decisão de interferir com a Lei e funcionamento das altas instituições judiciais do país?
Uma vingança pela oposição (na altura governo) que nunca concordou com a teoria de atentado no trágico "Acidente de Smolensk" em 2010 e até com o facto de colocarem o cadáver do Presidente em Cracóvia (no Palácio de Wawel - correspondente ao Panteão Nacional em Portugal). Oposição essa que, no sua convicção, eventualmente conspirou, com a Rússia, para que a aeronave presidencial se despenhasse?
Os motivos pessoais de Kaczyński parecem arrastar a Polónia para uma instabilidade política sem precedentes desde 1989, ano em que décadas de um regime totalitário absurdo e mantido com mão-de-ferro Soviética chegou ao fim abrindo as portas para que a este país finalmente se encontrasse consigo próprio e posteriormente com o outro lado do hemisfério, com o qual se identifica em inúmeros aspectos, mantendo a sua identidade e voz no continente europeu, ainda que não forçosamente de mão dada com a Igreja Católica e com valores conservadores a que nem todos os polacos aspiram, apoiam e suportam.
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