segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Łódź e a teoria das janelas partidas


 O assassinato despropositado de um jovem de 20 anos, o fim-de-semana passado, na principal rua de Łódź, a ulica Piotrkowska, levantou uma onda de indignação nos principais media da cidade e nos habitantes do velho e desbotado centro. Exige-se mais segurança e medidas que não só desencorajem meliantes e a "escumalha" mas também que revitalizem uma das zonas urbanas mais problemáticas e ao mesmo tempo mais movimentadas de Łódź. 


A Teoria das Janelas Partidas, baseada nos estudos e livro de James Wilson e George Kelling, surgiu no ano de 1983 e procurava explicar a relação entre o pequeno crime e o escalamento que este eventualmente provoca no meio circundante tornando zonas pacatas em verdadeiros guetos. Para isto utilizaram dois automóveis do mesmo modelo e marca mas estacionaram-nos de capot aberto em dois ambientes completamente distintos; um na Bronx em Nova Iorque, na altura uma zona problemática, e outro em Palo Alto na Califórnia, um bairro de classe média e média-alta, tido como uma "boa vizinhança". O primeiro automóvel foi prontamente "visitado" por um casal e filho menor que trataram de levar para casa o radiador e a bateria e poucas horas depois restava pouco mais do que a carcaça do mesmo. O veículo que ficou na Califórnia permaneceu intacto. Duas semanas depois foi o próprio autor do estudo que, face ao desinteresse, decidiu partir uma janela do mesmo constatando que isso foi o suficiente para que outros estragassem mais um pouco. Para grande espanto dos autores do estudo alguns dos vândalos eram senhores engravatados que pontapearam o carro deixando mais uma mossa. Dias depois o carro de Palo Alto estava num estado semelhante ao de Nova Iorque.  

Com isto pretendiam provar que a negligência e o abandono criam no colectivo a ideia que "ninguém quer saber" e desse modo surgem abusos e destruição gratuita. Por outro lado se houver interesse e de cada vez que se partir uma janela coloca-se uma nova os prevaricadores não vão em principio repetir a façanha. Como em todos os estudos esta teoria das janelas partidas recebeu criticas mas também elogios e réplicas, inclusivamente na Europa, com resultados semelhantes àqueles dos Estados Unidos.



À parte de alguns grafitti que são autenticas obras de arte o centro urbano de Łódź encontra-se conspurcado com "tags" e pinturas insultuosas entre fanáticos e ultras dos dois principais clubes futebolísticos da cidade.

Łódż é um exemplo disto. Um centro urbano esquecido, negligenciado e desbotado que tem visto pouco ou mesmo nenhum interesse por parte da câmara municipal e do governo polaco. Edifícios devolutos e negligenciados e uma praga de grafitti futebolísticos dos ultras dos dois clubes da cidade, o ŁKS e o Widzew, grassam no centro da cidade e nos arredores como erva-daninha. Mesmo quando alguém pinta por cima bastam poucas horas para voltarem a reaparecer. Estão em geral carregados de impropérios ao clube rival ou então com referencias aos hooligans e ao orgulho no holiganismo, por vezes com referencias depreciativas ao judeus. A juntar-se a isto as inúmeras manufaturas e fábricas abandonadas com centenas de janelas partidas e outras tantas ruínas dos tempos da Republica Popular da Polónia.


Rua Kilinskiego, um exemplo de "ninguém quer saber". Só mesmo a demolição tem sido solução para acabar com certos edifícios problemáticos. O centro da cidade de Łódż é constituído sobretudo por kamienica (apartamentos) com mais de 100 ou 150 anos onde da rua principal entra-se por um portão e corredor sujo e bafiento para um pátio igualmente sujo e bafiento onde estão as entradas para os apartamentos e condomínios. Muitos deles por dentro estão impecáveis e os seus locatários e proprietários investiram neles, por fora - salvo raras exceções, é o que se vê e dá o aspeto feio e triste ao centro.

Neste cenário a morte do estudante Mateusz O., de 20 anos, numa madrugada de sábado para domingo, foi porventura a prova que o centro não só está negligenciado como cada vez mais entregue à escumalha. Mateuz O. estava na rua Piotrkowska com uma amiga quando um outro jovem - Rafał - que passeava embriagado com um amigo tropeçou nas pernas da jovem para, acto contínuo, esbofeteá-la sem pedir desculpas. Mariusz reagiu, como qualquer homem o faria, e decidiu tirar satisfações. Esse gesto custou-lhe a vida quando Rafał o esfaqueou 11 vezes. O último suspiro de Mateusz foi nos braços de um taxista que debalde o tentou salvar. Uma multidão acompanhou as exéquias fúnebres de Mateusz e organizou uma marcha espontânea na Piotrkowska. O assassino foi preso alguns dias depois.

Łódź tem de reparar as suas "janelas partidas" sob pena de vir a ter um gueto em vez de um centro urbano digno desse nome.

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