Nasceu em 2004, na cidade de Łódź, no Outono, junto com mais uns cinco ou seis irmãos e irmãs - chama-se Flora. O pai, pachorrento, ligeiramente obeso, raçado de Golden Retriever e a progenitora uma cadela de raça... "Cães da Polónia", o nariz era avermelhado e o trato difícil, muito nervosa e desconfiada. Ambos de cor amarelada.
Perdemos conta à quantidade de objectos que foram roídos e triturados durante a mudança dos dentes mas um deles foi o controlo remoto do televisor e o registo de propriedade do automóvel.
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A dona do casal - por sinal boa pessoa e que já não anda por cá no mundo dos vivos - entrou um dia em nossa casa. Cheirava, como de costume, a tabaco e a sua voz rouca tão característica soou a ultimato. A ninhada ia para o balde de água se não conseguisse arranjar donos para os cachorros. Até podia ser bluff mas como já sentia saudades da cadela Bonnie, que ficou em Portugal com a minha mãe, lá acedi a ver a cachorrada que estava na działka (uma espécie de casinha de campo) da senhora. Uma cachorrinha escolheu-nos, assim o decidimos. Pegaríamos no cão que viesse ter connosco e assim lá foi para casa, nos meus braços, uma cadelinha de cor creme que no espaço de um ano tornou-se um cão de tamanho médio.
A Flora tem uma paixão arrebatadora por um enorme cão negro, o vizinho do lado, de nome Regie. Quando se encontram há um vigoroso abanar de cauda e patas traseiras da Flora e a reação entusiasta do cão que depressa desperta para o amor... Ainda há um outro cão preto enorme mas esse, coitado, já é velhote, arrasta um pouco as patas e não desperta as mesmas emoções que o Regie...
Depois há o polaco que chamamos de maluco dos cães. Tem três bichos; dois cães pequenos - estilo gato - e um enorme de cor acastanhada. O enorme anda quase sempre solto e quando lhe põe a trela não consegue com a força do animal e acaba por desistir para depois passar a vida a berrar o nome do cão - Eder! Eder! Escusado será dizer que quando há encontros imediatos de terceiro grau com o maluco dos cães e um outro (o vosso escriba) são cenas trágico-comicas com ladradelas, rosnadelas e uns impropérios dos donos - uns em polaco e outros em português...
Depois ainda há as inimigas mortais, as cadelas. Todas, sem excepção. Odeiam-se! Um ódio profundo, de crispar o pelo e arreganhar os dentes. Fazem esperas na varanda, ficam a olhar para trás quando se cruzam, urinam onde as outras o fizeram e disputam os cães. Ah! Já me esquecia da bêbada dos cães de raça Pug (como aqueles no filme Men In Black). São três cães iguais, calmos e obedientes, acabam por ajudar a dona a encontrar o caminho de casa.
De facto os polacos parecem ser apreciadores de animais estimação, sobretudo cães e gatos mas há uma adoração especial por outros como porquinhos-da-índia (em tempos tivemos um que fez quatro vezes a viagem Portugal-Polónia), coelhos, ratinhos mas também ratazanas, chinchilas, tarântulas, cobras, tartarugas e claro os peixinhos de aquário que já se engloba nesse micro-cosmos da aquário-filia.
Digo que não quero voltar a ter cães quando chegar o dia em que a Flora for para o céu dos cachorros mas não sei, adoro aqueles focinhos e o modo como se alegram sempre que chegamos a casa, quer ser sempre a primeira a dar as boas-vindas. No entanto reconheço que manter um cão ou um gato dentro de um apartamento com dois ou três passeios diários não é porventura a melhor vida que se pode dar ao animal mas pelo menos é uma vida e não um balde cheio de água que teria posto um termo a tudo isto que acabei de descrever...
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