No passado Domingo – 6 de Junho – a edição do Jornal de Notícias continha um artigo, escrito pela jornalista Fátima Mariano, intitulado „Emigração Portuguesa Está Mais Qualificada”. Nesse artigo aparecem citações de alguns emigrantes portugueses, ditos da nova geração, entre os quais está o vosso escriba.
Por razões de espaço a entrevista, feita por correio-electrónico, não aparece na íntegra mas dá para retirar importantes ilações sobre a Diáspora portuguesa num tempo em que já ninguém precisa de „dar o salto” com a mala de cartão – como o fez Linda de Suza.
Foi com agrado que li o testemunho do Nuno Oliveira, que se encontra na Suiça em estágio no CERN (ver hiperligação aqui). Foi através de um fórum português, o Autohoje, que nos conhecemos virtualmente e através da blogosfera que vamos dando a conhecer as nossas experiências e vivências no estrangeiro. Muito ficou por dizer!
Por vezes dou por mim a sorrir quando me vejo neste papel de emigrante. Tal como outros portugueses cresci a ver em Agosto as matrículas dos carros dos emigrantes portugueses em França – os avec como então lhes chamavam – e conheci alguns deles que viviam na Suíça, na França ou na Alemanha, uns ficaram, outros regressaram para cumprir o sonho de construir a casa na terra ou por causa das saudades, muitas vezes os filhos regressaram aos países onde os pais estiveram emigrados porque não se conseguiram integrar na realidade portuguesa. Ser emigrante na Polónia, um país que na minha infância fazia parte do Bloco Soviético e era visto como uma ameaça chega a ser divertido, fico com a sensação de estar num país improvável de conhecer.
Segue-se agora o artigo publicado no JN e a entrevista na íntegra:
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Emigração portuguesa está mais qualificada
FÁTIMA MARIANO
Jovens quadros técnicos e científicos optam cada vez mais por fazer carreira no estrangeiro, devido às melhores oportunidades e salários.
Substituíram a mala de cartão por uma mala com rodinhas; já não passam a fronteira a pé, mas sim de avião; em vez de escreverem longas cartas a falar da nova vida e das saudades da família ou de fazerem curtos telefonemas de tempos a tempos, comunicam através das redes sociais, dos programas de conversação instantânea ou por telemóvel. Eis os novos emigrantes portugueses.
Num artigo publicado no anuário "Janus 2008", Helena Rato, investigadora do Instituto Nacional de Administração, descreve desta forma o novo cenário da emigração nacional: "verifica-se uma tendência ao aumento da população emigrante com menos de 29 anos de idade, enquanto que o ritmo de emigração da população mais velha tende a manter-se constante; a taxa de crescimento da emigração permanente é superior à da emigração temporária; na emigração permanente, verifica-se uma quase paridade entre os dois sexos, enquanto que a emigração temporária permanece essencialmente masculina; a emigração de trabalhadores qualificados tende a crescer mais do que a dos trabalhadores não qualificados".
Os portugueses que actualmente emigram já não o fazem com "uma mão à frente e outra atrás", refere a socióloga Margarida Marques, nem em "debandada", como dizia Orlando Ribeiro. "Esse Portugal já não existe", sublinha a mesma investigadora. Actualmente, são sobretudo jovens quadros técnicos e científicos que procuram oportunidades de enriquecimento profissional, o que também reflecte "a evolução do país", diz.
Tânia Cunha, de 27 anos, natural de Batocas (concelho do Sabugal), é licenciada em Matemática Aplicada e Computação pela Universidade de Aveiro e vive, desde Junho de 2007, em Madrid. Após o estágio profissional, em Aveiro, recebeu uma proposta de trabalho de uma empresa espanhola. Apesar de também ter tido propostas para ficar em Portugal, decidiu aceitar e diz não estar arrependida. As outras propostas eram "pouco ambiciosas face à proposta da consultora espanhola", explica.
Também Nuno Oliveira, de 25 anos, natural de Vila Branca, concelho de Albergaria-a-Velha, mudou-se para Genebra à procura de "uma boa oportunidade de carreira". Vive na Suíça desde Novembro de 2008, altura em que iniciou um estágio tecnológico no CERN - Laboratório Europeu de Física das Particulas, um "local único", como o próprio descreve.
Uma questão de sobrevivência
Margarida Marques sublinha que o mais correcto não é falar-se em novos emigrantes, mas sim de novas categorias de migrantes. Além dos que saem do país por uma questão de sobrevivência, há também os que "saem porque a multinacional em que trabalham lhes dá a possibilidade de irem para outro país ou os que saem à boleia de programas europeus, de bolsas de estudo ou de investigação".
Não foi esse o caso de Ricardo Taipa, de 37 anos, natural de Lisboa. Viveu um ano na Polónia em 2001, ao abrigo do programa europeu Eramus. Ali conheceu a mulher, uma polaca, com quem regressou a Portugal. Aqui viveram entre 2002 e 2004, mas "todos os factores conjugados pareciam empurrar-nos para fora", desabafa. As "poucas perspectivas de ter um emprego bem remunerado, do desemprego" e do facto de a mulher não poder ter visto de residência (na altura, a Polónia não pertencia à União Europeia), levaram o casal a regressar à Polónia.
Actualmente, Ricardo Taipa é consultor informático na Fujitsu Technological Solutions em Lodz, a segunda maior cidade polaca. Afirma que nunca teve ensejo de deixar Portugal, "um país fantástico e realmente bonito", mas onde a única solução de vida que tinha era a de "endividar-se até ao tutano".
Este consultor informático diz que a Polónia "está longe de ser o ideal de país para viver" e, por isso, não afasta a hipótese de emigrar com a mulher, Paula, e os dois filhos entretanto nascidos, Manuel de quatro anos, e o Marcel, com um ano e meio. Portugal está, definitivamente, de parte, pois aqui "só se vive na plenitude com bastante dinheiro no bolso", lamenta.
Margarida Marques chama a atenção para o facto de haver um conjunto de países com economias emergentes, como os do continente africano ou asiático, onde há muito ainda por fazer e falta mão-de-obra qualificada. Dá o exemplo de Angola, onde estão perto de 75 mil emigrantes portugueses, e "que precisa de tudo, desde médicos a professores, pessoal da construção civil a engenheiros".
Empreendedorismo dos emigrantes
José Marques, professor-adjunto da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Leiria, prefere falar em mobilidade mais do que em migração, visto ser cada vez mais comum as saídas de duração limitada para realizar trabalhos específicos, por um lado, e porque muitos emigrantes qualificados acabam por se mudar de um país para outro com grande rapidez.
À semelhança de Ricardo Taipa, também Tânia Cunha não coloca de parte voltar a emigrar. "Não descarto a possibilidade de emigrar para outro país. Viver e trabalhar noutro país continuaria a ser um contributo importante para o meu crescimento profissional e pessoal", diz.
Este investigador está a desenvolver um estudo sobre "Empreendedorismo transnacional dos emigrantes portugueses", uma área pouco estudada no país. Na apresentação do trabalho, explica que "estudos de vários países têm demonstrado que o auto-emprego e o empreendedorismo migrante têm funcionado em diversos contextos como uma nova via de acesso ao mercado de trabalho dos países de acolhimento".
Embora o estudo esteja no início e se cinja à comunidade portuguesa radicada na Suíça, José Marques referiu que "os empresários nacionais têm aproveitado os emigrantes empreendedores para vender os seus produtos fora do país".
A este propósito, Nuno Oliveira diz que o "preocupa bastante a situação das empresas portuguesas", que não considera "competitivas". "Temos uma carga fiscal elevada e recursos humanos pouco qualificados, o que leva a baixa produtividade e produtos com pouco valor acrescentado". Diz que "seria necessário apostar na formação real de qualidade (a nível técnico e superior), investir em I&D e reduzir os encargos a nível de impostos das empresas".
Fuga de cérebros?
Há quem classifique este movimento emigratório de quadros qualificados como uma "fuga de cérebros", com tudo o que de negativo tal implica para o desenvolvimento de Portugal, mas Margarida Marques recusa esta lógica de pensamento. "A realidade migratória é altamente dinâmica, está sempre em movimento. Isto é extremamente positivo e é bom que os portugueses sem apreciados e reconhecidos no exterior", refere a investigadora do Gabinete de Investigação em Sociologia Aplicada da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH/UNL).
Nuno Oliveira partilha da opinião: "Só quem nunca saiu de Portugal pensa que não temos valor. Estamos em pé de igualdade com os nossos colegas europeus, apenas precisamos de um sistema a funcionar e que retire o melhor dos nossos recursos", conclui este investigador do CERNE.
Apesar de o fenómeno emigratório ser bastante flutuante, não há, em Portugal, dados quantitativos que permitam fazer estudos mais profundos sobre estes novos emigrantes. Desde 2003 que o Instituto Nacional de Estatísticas deixou de coligir estes dados e o Observatório da Emigração, criado em 2008, encontra-se ainda a recolher indicadores estatísticos.
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Emigração portuguesa está mais qualificada
FÁTIMA MARIANO
Jovens quadros técnicos e científicos optam cada vez mais por fazer carreira no estrangeiro, devido às melhores oportunidades e salários.
Substituíram a mala de cartão por uma mala com rodinhas; já não passam a fronteira a pé, mas sim de avião; em vez de escreverem longas cartas a falar da nova vida e das saudades da família ou de fazerem curtos telefonemas de tempos a tempos, comunicam através das redes sociais, dos programas de conversação instantânea ou por telemóvel. Eis os novos emigrantes portugueses.
Num artigo publicado no anuário "Janus 2008", Helena Rato, investigadora do Instituto Nacional de Administração, descreve desta forma o novo cenário da emigração nacional: "verifica-se uma tendência ao aumento da população emigrante com menos de 29 anos de idade, enquanto que o ritmo de emigração da população mais velha tende a manter-se constante; a taxa de crescimento da emigração permanente é superior à da emigração temporária; na emigração permanente, verifica-se uma quase paridade entre os dois sexos, enquanto que a emigração temporária permanece essencialmente masculina; a emigração de trabalhadores qualificados tende a crescer mais do que a dos trabalhadores não qualificados".
Os portugueses que actualmente emigram já não o fazem com "uma mão à frente e outra atrás", refere a socióloga Margarida Marques, nem em "debandada", como dizia Orlando Ribeiro. "Esse Portugal já não existe", sublinha a mesma investigadora. Actualmente, são sobretudo jovens quadros técnicos e científicos que procuram oportunidades de enriquecimento profissional, o que também reflecte "a evolução do país", diz.
Tânia Cunha, de 27 anos, natural de Batocas (concelho do Sabugal), é licenciada em Matemática Aplicada e Computação pela Universidade de Aveiro e vive, desde Junho de 2007, em Madrid. Após o estágio profissional, em Aveiro, recebeu uma proposta de trabalho de uma empresa espanhola. Apesar de também ter tido propostas para ficar em Portugal, decidiu aceitar e diz não estar arrependida. As outras propostas eram "pouco ambiciosas face à proposta da consultora espanhola", explica.
Também Nuno Oliveira, de 25 anos, natural de Vila Branca, concelho de Albergaria-a-Velha, mudou-se para Genebra à procura de "uma boa oportunidade de carreira". Vive na Suíça desde Novembro de 2008, altura em que iniciou um estágio tecnológico no CERN - Laboratório Europeu de Física das Particulas, um "local único", como o próprio descreve.
Uma questão de sobrevivência
Margarida Marques sublinha que o mais correcto não é falar-se em novos emigrantes, mas sim de novas categorias de migrantes. Além dos que saem do país por uma questão de sobrevivência, há também os que "saem porque a multinacional em que trabalham lhes dá a possibilidade de irem para outro país ou os que saem à boleia de programas europeus, de bolsas de estudo ou de investigação".
Não foi esse o caso de Ricardo Taipa, de 37 anos, natural de Lisboa. Viveu um ano na Polónia em 2001, ao abrigo do programa europeu Eramus. Ali conheceu a mulher, uma polaca, com quem regressou a Portugal. Aqui viveram entre 2002 e 2004, mas "todos os factores conjugados pareciam empurrar-nos para fora", desabafa. As "poucas perspectivas de ter um emprego bem remunerado, do desemprego" e do facto de a mulher não poder ter visto de residência (na altura, a Polónia não pertencia à União Europeia), levaram o casal a regressar à Polónia.
Actualmente, Ricardo Taipa é consultor informático na Fujitsu Technological Solutions em Lodz, a segunda maior cidade polaca. Afirma que nunca teve ensejo de deixar Portugal, "um país fantástico e realmente bonito", mas onde a única solução de vida que tinha era a de "endividar-se até ao tutano".
Este consultor informático diz que a Polónia "está longe de ser o ideal de país para viver" e, por isso, não afasta a hipótese de emigrar com a mulher, Paula, e os dois filhos entretanto nascidos, Manuel de quatro anos, e o Marcel, com um ano e meio. Portugal está, definitivamente, de parte, pois aqui "só se vive na plenitude com bastante dinheiro no bolso", lamenta.
Margarida Marques chama a atenção para o facto de haver um conjunto de países com economias emergentes, como os do continente africano ou asiático, onde há muito ainda por fazer e falta mão-de-obra qualificada. Dá o exemplo de Angola, onde estão perto de 75 mil emigrantes portugueses, e "que precisa de tudo, desde médicos a professores, pessoal da construção civil a engenheiros".
Empreendedorismo dos emigrantes
José Marques, professor-adjunto da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Leiria, prefere falar em mobilidade mais do que em migração, visto ser cada vez mais comum as saídas de duração limitada para realizar trabalhos específicos, por um lado, e porque muitos emigrantes qualificados acabam por se mudar de um país para outro com grande rapidez.
À semelhança de Ricardo Taipa, também Tânia Cunha não coloca de parte voltar a emigrar. "Não descarto a possibilidade de emigrar para outro país. Viver e trabalhar noutro país continuaria a ser um contributo importante para o meu crescimento profissional e pessoal", diz.
Este investigador está a desenvolver um estudo sobre "Empreendedorismo transnacional dos emigrantes portugueses", uma área pouco estudada no país. Na apresentação do trabalho, explica que "estudos de vários países têm demonstrado que o auto-emprego e o empreendedorismo migrante têm funcionado em diversos contextos como uma nova via de acesso ao mercado de trabalho dos países de acolhimento".
Embora o estudo esteja no início e se cinja à comunidade portuguesa radicada na Suíça, José Marques referiu que "os empresários nacionais têm aproveitado os emigrantes empreendedores para vender os seus produtos fora do país".
A este propósito, Nuno Oliveira diz que o "preocupa bastante a situação das empresas portuguesas", que não considera "competitivas". "Temos uma carga fiscal elevada e recursos humanos pouco qualificados, o que leva a baixa produtividade e produtos com pouco valor acrescentado". Diz que "seria necessário apostar na formação real de qualidade (a nível técnico e superior), investir em I&D e reduzir os encargos a nível de impostos das empresas".
Fuga de cérebros?
Há quem classifique este movimento emigratório de quadros qualificados como uma "fuga de cérebros", com tudo o que de negativo tal implica para o desenvolvimento de Portugal, mas Margarida Marques recusa esta lógica de pensamento. "A realidade migratória é altamente dinâmica, está sempre em movimento. Isto é extremamente positivo e é bom que os portugueses sem apreciados e reconhecidos no exterior", refere a investigadora do Gabinete de Investigação em Sociologia Aplicada da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH/UNL).
Nuno Oliveira partilha da opinião: "Só quem nunca saiu de Portugal pensa que não temos valor. Estamos em pé de igualdade com os nossos colegas europeus, apenas precisamos de um sistema a funcionar e que retire o melhor dos nossos recursos", conclui este investigador do CERNE.
Apesar de o fenómeno emigratório ser bastante flutuante, não há, em Portugal, dados quantitativos que permitam fazer estudos mais profundos sobre estes novos emigrantes. Desde 2003 que o Instituto Nacional de Estatísticas deixou de coligir estes dados e o Observatório da Emigração, criado em 2008, encontra-se ainda a recolher indicadores estatísticos.
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A entrevista na totalidade:
1 - Gostaria de saber a sua idade, naturalidade e percurso académico e
o que faz actualmente.
Tenho 37 anos, nasci em Lisboa mas podia ter nascido em Luanda. Em 1974 regressamos a Portugal e vivemos em São João do Estoril de ondesaímos em 1979 rumo ao Norte para Vila Nova de Famalicão. Em2004 emigrei para a Polónia, cidade de Łódź. Comecei por estudar Direito na Universidade Moderna mas só lá estive um ano, era demasiado entediante. Em 1996 entrei na Universidade Fernando Pessoa para o curso de Engenharia Publicitária – que vou concluir este ano depois de um interregno de quase dez anos. Estou no meu terceiro emprego na Polónia, neste momento trabalho como share desk consultant para a Fujitsu Technological Solutions em Łódź.
2 - Desde quando vive na Polónia e por que decidiu ir?
Na realidade conheço a Polónia desde 2001, ano em que decidi inscrever-me no programa Erasmus. De 2002 a 2004 vivi com a minha companheira polaca em Portugal mas todos os factores conjugados pareciam empurrar-nos dali para fora. Poucas perspectivas de ter um emprego bem remunerado, desemprego e a própria política de emigração que impediu a minha mulher de ter visto de residência – mesmo estando legalmente casada com um cidadão português (nessa altura a Polónia ainda não era parte da UE). Na Loja do Cidadão de Braga chegaram a sugerir que ela deveria ir para a Polónia até o visto ser emitido (sine die) ou em contrapartida não sair de casa para evitar o repatriamento.
3 - Foi sempre seu desejo viver/trabalhar fora de Portugal ou
tratou-se de uma necessidade?
Nunca tive especial ensejo de trabalhar fora do meu país. Portugal é um país fantástico e realmente bonito, no continente e nas ilhas, com uma gastronomia de fazer água na boca (não só aos nacionais) e com um clima agradável a maior parte do ano mas só com desafogo financeiro se goza na plenitude. Como na Polónia a minha mulher tinha casa própria e mobilada e em Portugal só nos restava endividar-nos até ao tutano, para comprar um pequeno apartamento, a decisão estava praticamente tomada, além disso dei por mim a criticar demasiado o país e os políticos (foi na altura em que Durão Barroso foi para a Comissão) e quem não está bem põe-se, segui o exemplo de Barroso...
4 - Conhecia alguém na Polónia que tenha ajudado na sua integração?
A minha companheira de vida, a Paula. Conhecemo-nos em 2001 e a partir daí só queriamos estar juntos e ter um projecto de vida em comum. Evidentemente que nestas condições a integração é meio caminho andado.
5 - Foi difícil a adaptação a um novo país, a uma nova forma de estar
na vida e no trabalho?
Para mim não. Aliás, diz-me a experiência, os portugueses têm de facto uma capacidade de adaptação inusitada. O melhor a fazer é tomar a atitude de viver como os locais portanto na Polónia faço o possível por viver como se fosse um cidadão polaco e em Portugal volto rapidamente aos meus hábitos portugueses, o que se torna difícil pois na Polónia jantamos entre as 17 e as 18 e não damos dois beijinhos na cara para cumprimentar, entre outros gestos tipicamente latinos.
Profissionalmente tive experiências curiosas; uma numa empresa polaca, durante cinco anos, que me levou a viajar por esse mundo fora mas sem perspectivas de crescimento e que financeiramente não compensava e posteriormente um falhanço total com um compatriota que se revelou nada mais do que um vigarista, nunca assinou contrato de trabalho, não pagou o salário aos empregados e a mercadoria aos fornecedores portugueses - disse que não tinha dinheiro. Não deixa de ser caricato
que o único problema que tive com o patronato na Polónia foi precisamente com um português. Desde Janeiro que trabalho no Centro Global da empresa japonesa Fujitsu Technological Solutions e já tenho contrato por tempo indeterminado.
6 - Que visão tinha da vida dos emigrantes antes de partir para a
Polónia e que visão tem agora?
Os emigrantes que tinha na minha família estavam em países típicos da Diáspora portuguesa; França, Brasil e África do Sul, de resto conheci muitos ex-emigrantes e emigrantes em França, Suiça, Luxemburgo e Alemanha. Pareciam satisfeitos com a vida no estrangeiro e os que estavam em Portugal sentiam-se algo como um peixe fora de água depois de tantos anos fora do país.
A emigração actual e a minha visão do emigrante português mudou mais que não seja pelo simples facto de me ter tornado um deles. É notória a quantidade de portugueses com formação superior a viverem no estrangeiro, acabam por encontrar o seu lugar ao sol e é um facto conhecido a nossa habilidade para aprender, falar e compreender outros idiomas, muitos de nós falam mais de quatro idiomas europeus o que, no caso dos polacos, os deixa sempre surpreendidos, mais ainda quando
falamos polaco, um idioma extremamente complexo e difícil de aprender.
7 - Vai continuar a viver na Polónia? Gostaria de trabalhar/viver
noutro país? Qual?
Para já sim ainda para mais depois dos filhos terem nascido, o Manuel com quatro anos e o Marcel com um ano e meio. As creches e os infantários, em Łódź, custam mensalmente entre 100€ a 250€ (privados) e pelo que vejo são bons e incluem actividades lúdicas e extras como língua estrangeira (inglês), música, dança, ginástica e outras actividades. O Manuel está perfeitamente integrado na creche entre os seus amigos e amigas polacas, isso conta no momento de ponderar um outro país para viver e trabalhar.
A Polónia está longe de ser ideal como país para viver e quem sabe um dia vamos para outro onde se fale língua inglesa como o Reino Unido, Austrália, Nova Zelândia? Portugal parece estar fora dessa equação, como já disse anteriormente o nosso país só se vive na plenitude com bastante dinheiro no bolso.
7 - Com que frequência vem a Portugal e o que pensa da situação
sócio-económica do país? E a da Polónia?
Menos do que gostaria! Os salários na Polónia ainda são relativamente baixos em comparação com os salários da „velha UE“ mas paulatinamente vão-se aproximando, mesmo assim não tenho desafogo financeiro para ir a Portugal todos os anos, já não vou ao meu país há quase dois anos,
em parte por causa do nascimento do Marcel e da situação complicada em que me deixou o tal português desonesto, mas este ano penso que vamos passar umas semanas a Lisboa, onde está a maior parte da minha família.
Acompanho as notícias do nosso país através de jornais portugueses online - praticamente não vejo televisão - ouvindo os meus familiares e também os comentários de compatriotas na blogosfera, no fórum da Autohoje e no Facebook. A classe-média está a ser completamente sacrificada pelo governo, é notório um fosso cada vez maior entre quem tem posses e quem vive no limite e a esticar a corda ao fim do mês ou, em contrapartida a recorrerem ao crédito para manterem um determinado nível de vida, vulgo, as aparências. Fico com a sensação que Portugal está como escreveu o nosso grande poeta Fernando Pessoa em Mensagem: "Tudo é disperso, nada é inteiro. Ó Portugal, hoje és nevoeiro“. A Polónia tem uma grande vantagem em relação a Portugal, não é um país periférico, fica no coração da Europa e está numa posição geográfica privilegiada para o comércio com os países da Europa Ocidental e de Leste. 40 milhões de almas fazem da Polónia um mercado com grande potencial e prova disso são os investimentos e sucesso de alguns grupos portugueses como o Grupo Jerónimo Martins e os supermercados Biedronka, o Millenium Bank, Mota Engil, Colep CCL, os parques eólicos da EDP, Simoldes plásticos, vinhos Atlantyka etc. No entanto o excesso de burocracia, resquícios do comunismo, e os niveis de corrupção elevados na Polónia são ainda um entrave e factor de abrandamento para a economia, já foi muito pior mas há ainda muito
caminho a desbravar.
10 comentários:
Muito bom! :) Há coisas que só vivendo, não interessa as críticas!
Abraço!
P.S. Tenho de fazer uma "posta" no meu!
Obrigado. Claro que sim. Abraço.
Consultor Informático na FJT, muitos parabéns pela promoção!
Isso é tudo muito bonito, mas só gostava de saber o que faz uma entrevista a um lisboeta no JN?? É que os restantes camaradas de artigo eram de terras de trabalhadores: Batocas (Sabugal) ou Vila Branca (Albergaria-a-Velha).
@ Rui, a tradução foi feita por os jornalistas. Help Desk Consultant é o que está escrito no contrato. Gostaria também de saber a tua opinião sobre isto sem ser exclusivamente um comentário sobre a minha função na FTS.
@ Fernando. Apenas nasci em Lisboa, tomaram-me como lisboeta mas no fundo cresci em Famalicão e formei família em Łódź. Sou um cidadão do mundo... :)
Promoção no jornal!
E a tua opinião?
este algarvio residente no mesmo país que tu tem mais ou menos o mesmo pensar, tirando o manuel e o marcel.
subscrevo a entrevista.
Muito interessante, especialmente os seus pensamementos sobre a Polónia. Aga
é muito interessante ler os seus comentários, especialmente como uma polaca que trabalhava na Fujitsu em Lisboa como help desk assistant ;) abraços! Asia
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