sexta-feira, 4 de junho de 2010

A “guerrilha“ da batata...

A aculturação é assim mesmo, por um lado podemos perfeitamente aceitar e até apreciar certas coisas ou, por outro, não assimilar ou evitar outras. Este problema ocorre com alguma frequência quando nos tocam nos hábitos e preferências alimentares pois nós, portugueses, somos um povo “de mesa“ e temos dois repastos bem definidos chamados de almoço e jantar - até temos pausa no trabalho por causa do dito e como nos sabe bem um cafezito depois da refeição!

Num lar tipicamente polaco não há alguns hábitos que, regra geral, acontecem num lar português; o pequeno-almoço com café e pão com manteiga ou queijo, o almoço com direito a restaurante (como muitos portugueses fazem) e o jantar ao estilo second round depois da tal “almoçarada“ que, em muitos casos, ainda é intercalada com um lanche. 
Na Polónia talvez se vá petiscando mais ao longo do dia mas a “cultura“ do restaurante e de estar à mesa em amena cavaqueira - mesmo depois de não haver mais comida no prato - não tem muitos praticantes, o mesmo com a nossa “cultura“ do vinho que ainda conhece poucos apreciadores nestas paragens da nossa velha Europa, quantos portugueses que já vieram à Polónia e conviveram com famílias polacas ficaram surpreendidos ao verem que eles bebem chá quente às refeições? 

No nosso apartamento o inicio do dia tem muitas vezes o cheiro de café e o arroz, quando feito por mim, o inconfundível aroma do estrugido, ou seja, do tacho com azeite e cebola picada a alourar. O azeite não é a base da cozinha polaca e algumas iguarias, que fazem muitos polacos ficarem de água na boca, não me provocam nenhum efeito.

Prato tipicamente polaco, o gołombki (pombo em polaco) com batata cozida

Foi nesse sentido que hoje voltou a haver uma clivagem ao jantar - para mim arroz com almôndegas e para elas o gołąbki (leia-se gou-onbqui) com batata cozida. Num dia quente como o de hoje um pedaço de carne picada embrulhada em folhas de couve não pode ter lugar, nem que seja acompanhado por uma cerveja Lech fresquinha! São daqueles pratos bons para se comer no Inverno, quando fazem temperaturas negativas e precisamos de muitas calorias para enfrentar o vento gélido e a neve. Pela sua vaga semelhança com a francesinha sempre posso fazer como os marujos da Nau Catrineta que queriam comer a sola das botas como se fosse um bife - fecho os olhos, imagino que o gołąbki é uma francesinha com batata e como!

Uma ida a um restaurante polaco, por exemplo, raramente tem entradas como um cestinho com pão, manteiga e muito menos azeitonas. Os polacos querem sentar-se à mesa e serem servidos o mais rápido possível, não parecem preocupar-se com o facto de um bom prato demorar algum tempo para ser bem confeccionado e não são pessoas de ficarem muito tempo no restaurante. Pergunto-me se o hábito polaco de deixarem o ambiente dos restaurantes a meia-luz ou com luz fraca influência isso, quantas vezes não fico “pitosga“ a ler o menu à luz de uma velinha ou acabo por ficar com sono. Felizmente não encontramos, como em Portugal, um televisor com o volume alto quando chega a hora do noticiário ou quando há um jogo de futebol.

Recordo-me do casamento de um compatriota com uma polaca, aqui em Łódź, no qual houve uma notória diferença cultural quando chegou a hora do copo de água. Os convivas polacos acabaram a refeição mais rapidamente e logo de seguida os animadores começaram a cantar com o volume demasiado alto para quem estava, como é tradição, em amena cavaqueira a saborear um bom vinho tinto. Entre conversar aos gritos ou estarem calados os portugueses só tiveram duas hipóteses; irem lá para fora ou juntarem-se à festa , beber e dançar.

O próprio gesto de beber álcool difere. O polaco  pode passar a semana sem tocar em álcool e costuma  desforrar-se aos fim-de-semana preferindo embebedar-se com vodka ou cerveja ao passo que o português pode beber  durante toda a semana um copo ou dois de vinho às refeições e uma cerveja ao almoço. Também tenho reparado que uma prova de virilidade entre os homens polacos é o consumo exagerado de  álcool, sobretudo vodka, o “ vamos ver quem aguenta mais“ ,sem adormecer, com porrada, ou tornarem-se estúpidos como um sapato e rirem-se das figuras que fazem. Quando virem um grupo de polacos a beberem vodka em tronco nu, descalços e a cantarem canções  patrióticas então já sabem que ali estão grandes compinchas, - se estiverem entre eles quase sempre ficam amigos para a vida. A natureza mais reservada dos polacos leva-os a terem de recorrer ao álcool para “quebrarem o gelo“ ao passo que alguns portugueses,  nem todos obviamente, devido à sua espontaneidade, parecem estar bêbados - para os standards polacos - mesmo quando estão perfeitamente sóbrios...


1 comentário:

PM Misha disse...

hehehe! acho que com respeito ao álcool os polacos são sprinters e nós somos mais maratonistas. o objetivo do polaco é enfrascar-se rapidamente e desfrutar do pico de euforia que a cadela lhe dá até cair de redondo, o tuga gosta mais de se embebedar progressivamente e ter mais tempo de percepção do que o rodeia. pôr um tuga a fazer de polaco, ou seja, a beber como eles, não dá bom resultado. o tuga cai inanimado enquanto o polaco puxa de um cigarro.