sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Caleidoscópio Polónia 2016


Mais um ciclo se encerra e outro se inicia e não há nada como um novo ano para reflectir nas escolhas, caminhos traçados, objectivos e obstáculos que nos foram aparecendo, sentimentos reflectidos com mestria por o grande poeta português Fernando Pessoa neste lindíssimo poema;

Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,
Mas não esqueço de que minha vida
É a maior empresa do mundo…
E que posso evitar que ela vá à falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver
Apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e
Se tornar um autor da própria história…
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar
Um oásis no recôndito da sua alma…
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um “Não”!!!
É ter segurança para receber uma crítica,
Mesmo que injusta…

Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo…

Caleidoscópio

Dizem os sábios em astrologia que 2016 foi a um <<nível cósmico>> um ano com alinhamentos planetários desfavoráveis à harmonia e paz no nosso planeta e Mercúrio Retrogrado presente em inúmeras ocasiões ao longo dos doze meses do calendário. Astrologia à parte, e pessoalmente (está a ser sobretudo a nível profissional) uma verdadeira montanha-russa que ainda não chegou ao fim...

Em 2016 o mundo viu alterações profundas no panorama politico internacional sobretudo com a surpreendente (ou não) eleição de Donald Trump para Presidente da nação mais poderosa do planeta - com todas as consequências possíveis que isso trará nos próximos quatro anos - e uma Europa que viu o Reino Unido a recusar a chamada <<família europeia>> com o Brexit favorável a um não à UE ao fim de mais de quarenta anos de casamento, segue-se o divórcio - aparentemente litigioso...

Um dos cartoons mais significativos de 2016 relativamente à UE.

Estamos numa Europa cada vez mais dividida com uma União Europeia desgovernada, pesada e gorda, centralizada em instituições financeiras e agora descaradamente alemã (as decisões parecem vir dos bancos alemães e do Chanceler e não mais de Bruxelas), sem um controlo efectivo das suas fronteiras perante as crises migratórias de países vitimas das <<guerras energéticas>>, estupidamente politicamente correcta, com os media controlados ad nausea por a mesma mentalidade frouxa e hipócrita.

Cenários de guerra ainda que ninguém preste muita atenção...

Estar e continuar a viver na Polónia ou na Europa Central (exceptuando a Áustria eventualmente) parece ser cada vez mais um jogo de tabuleiro onde ninguém sabe ao certo quem será o vencedor, que cartas podem sair ou qual o resultado dos dados assim que parem de rolar.


Tropas americanas treinam na Polónia em Konotop. Fonte

Enquanto assistíamos à nossa histórica vitoria no Euro 2016 e gozávamos o Verão europeu a NATO organizava em Varsóvia uma das mais importantes cimeiras desde o final da Guerra-Fria. Países outrora parte do Pacto de Varsóvia mostram-se claramente contra a sempre poderosa e por vezes imprevisível Rússia.



Vladimir Putin e o poderio militar russo mostram-se visivelmente agastados, fazem peito e mostram os punhos à NATO e aos EUA. Não mostram medo, a Crimeia é parte da Federação e não há discussão e envolvem-se no conflito sírio, ao lado de Assad que o Ocidente e a sua bem oleada máquina de propaganda (o mainstream media) consideram alvo a abater a qualquer custo, como fizeram com Gadafi libertando o conteúdo da Caixa de Pandora assim que a Líbia e o Norte de África se viram sem o ditador - ironicamente um equilíbrio à paz naquela zona.

A Polónia está determinada a ser um membro-chave da NATO e a fazer braço-de-ferro com a Rússia, ainda esta semana mais um contingente de tropas americanas, respectivos blindados e armamento pesado chegou à Polónia, concentram-se tropas a Leste, sobretudo na fronteira com os Estados Bálticos. Testemunho de um compatriota que recentemente esteve na Lituânia confirma o clima de escalamento militar com o receio de um repentino ataque russo. Os russos por seu lado acusam os EUA e a NATO de os provocarem, de estarem a montar uma barreira, uma cilada, ao redor das fronteiras do seu país e que apenas se defendem da agressão do Ocidente e da politica externa dos EUA.

A juntar ao caldeirão a intenção da criação de um exército da União Europeia que, se se tornar realidade, será um potencial factor de instabilidade no continente, ainda para mais com a exclusão do Reino Unido num cenário pós-Brexit.

Consta em documentos do tempo da Guerra-Fria (não encontrei ainda a fonte mas actualizarei logo que disponível) que o possível cenário em caso de guerra com a então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas seria primeiramente um conflito armado no território da Polónia entre a URSS, os países do Pacto de Varsóvia e a Aliança Atlântica. Entretanto Bruxelas seria o primeiro alvo dos misseis nucleares soviéticos e a Polónia, como se se tratasse de uma arena, seria onde a maior parte das bombas (convencionais e nucleares) cairiam antes de uma guerra final ou até que uma solução diplomática servisse para evitar um cataclismo global. Cenários que todos desejam sejam apenas arquivos sinistros numa cave algures em Moscovo...

Jornada Mundial da Juventude (Cracóvia 2016)

2016 foi também o ano das Jornadas Internacionais da Juventude a terem lugar na icónica cidade de Cracóvia na "Pequena Polónia", felizmente sem ataques terroristas a ensombrarem o evento religioso que foi tido por muitos como exemplar servindo também para divulgar o país que ainda é relativamente desconhecido por muitos europeus e estrangeiros. Curiosamente fui nessa altura contactado por um amigo de longa data dos automóveis que tinha a filha a caminho da Polónia e ao qual me prontifiquei a ajudar no que fosse necessário. Pelo que fiquei a saber ela gostou do país e dos polacos, deixando-lhe uma impressão positiva da Europa Central.

O segundo ano do partido PiS (Lei e Justiça) no governo. 

O plano governamental 500+ que previa um subsidio de quinhentos PLN (110€) a partir do segundo filho foi em frente e na senda de tornar a Polónia um país exemplarmente católico apostólico romano a decisão de tornar o aborto ilegal revelou-se um tiro que saiu pela culatra...


As polacas (sobretudo elas) fizeram greve chamando-lhe Czarny Protest (protesto negro), saíram à rua na capital, nas grande urbes, protestaram e marcharam num deprimente dia de neblina e chuva, partilharam a revolta nas redes sociais, fizeram-se ouvir e meteram medo ao poder politico instalado em Varsóvia de tal modo que no final muitos dos políticos do PiS assobiaram para o lado como se não fosse nada com eles...

A publicidade do avô polaco

O site da Allegro - um dos principais leiloeiros on-line na Polónia - trouxe uma agradável surpresa no panorama publicitário polaco, nesta época pejada de spots publicitários repetitivos, amiúde bacocos alusivos ao Natal ou a medicamentos milagrosos para a gripe, constipação, fígado, intestinos, estômago, migrina, nervos, sono, micose da unha, virose (é só nomear...).



O curso de inglês para principiantes que o avo polaco compra on-line e vai aprendendo ao longo de meses em post-it's e mono-diálogos serve para, quando chega a Londres, falar em inglês com o seu netinho (um lindo mulatinho o que é particularmente significante perante certas atitudes racistas) que nunca viu e não sabe polaco. I am your grandfather... 

E pronto... o vosso escriba que até é um "gajo" nada fácil de chorar, que estudou publicidade na universidade, leu sobre manipulação psicológica, spy-ops e não perde teorias da conspiração (como aquela que o 11 de Setembro tem muito que se lhe diga), que fica comovido - mal se nota - sente aquele repentino nó na garganta, o toque no peito (plim!), o arrepio na espinha que não quer sentir (boys don't cry) e pronto... soluça uma, duas vezes retirando-se num canto para que ninguém o veja. Não verte lágrimas porque se o fizer é abrir uma comporta que vai ser difícil conter mas fica com os olhos "marejados", como escreviam os poetas...

Recordei-me daquele dia, semanas depois do meu pai falecer em 2002, quando ao sentar no sofá ao lado da sua impecavelmente organizada mesinha de cabeceira  notei que ele andava a estudar inglês, num livro - talvez dos anos sessenta - que ali estava em casa há décadas. O francês e o português (ainda era cedo demais) não servia com aquela polaca que eu lhe tinha dito (jurado) ser a mulher com quem havia casar (eu casar... devia estar doido ou a ver romantic commedies em demasia) e ele dedicou-se ao inglês para poder comunicar com ela e duas semanas antes de eu a ir buscar ao aeroporto Sá Carneiro ele deixou este mundo, porra... 

Como teria sido?

Ano Novo telenovela nova...



Os turcos foram finalmente destronados no prime-time da TVP1... Acabou a novela turca "Rainha por uma Noite" ou Krolówa Jednej Nocy, acabou a cultura turca às 18:40 - para muitos polacos fãs das novelas turcas foi uma ofensa - agora aparecem uns outros morenos e morenas (com algumas excepções) a falarem um idioma estranho, mas é Europa e parece ser no Sul... Espanha? Itália? Grécia? Roménia? Não... Portugalia ou Portugal, aquele pequeno país na Península Ibérica quase como a aldeia de Obélix e Astérix.

Coração d'Ouro ou Złote Serce aparece dobrado em polaco - uma voz monocórdica - que literalmente abafa o português excepto nas canções - ouvir o "Bamos lá Cambada" do Herman José na TV polaca é surreal -  ou quando a dobragem é mais curta que o dialogo original.

Vemos o Porto (saudades!), o Douro Vinhateiro (fez-me lembrar os vídeos do Facebook do nosso compatriota varsoviano Nuno Bernardes no Algarve a fazer de conta que estava nos famosos socalcos), os Açores e de certo modo outras atracções do nosso belo país - sim é que é mesmo um lindíssimo país.

A verdade é que parte da opinião pública e alguns opinion makers estavam pouco felizes com a ideia de uma cultura tão distinta da polaca, sobretudo pela questão do Islão, ser promovida na televisão publica mesmo que o produto em si seja de qualidade - dizem que é (não sei porque não vi apesar de não ter nada contra series televisivas ou telenovelas). Uma novela portuguesa está inevitavelmente mais próxima do mundo polaco e oferece o nível de exotismo necessário - sim somos um país exótico para os polacos em geral - a par com paisagens deslumbrantes e, espera-se, um enredo convincente...

Talvez veja alguns episódios mas tentar ouvir português e polaco ao mesmo tempo é tarefa árdua!

1 comentário:

Ribeiroplace disse...

Parabéns pelo blog, muito interessante é sempre bom ler em português sobre a Polónia, um abraço desde Torun