sábado, 1 de fevereiro de 2014

Os Calimeros e o boi Bocas


A propósito de uma crónica na secção P3 do Público online intitulada "Já não há pachorra para os Calimeros", da autoria de Nuno Ferreira que, parece-me, ser jornalista pois apresenta-se de forma inconclusiva, "Nuno Ferreira nasceu no segundo mês dos anos 80 e gosta de gelatina de morango" (sic), recordei-me com nostalgia não só dos desenhos animados do Calimero mas igualmente do boi Bocas já que a referida crónica acaba por ser uma "boca" aos emigrantes anormais que pelos vistos têm sido entrevistados pela comunicação social portuguesa.





O Calimero diz que o país não lhe deu as oportunidades que ele merecia. Chora, porque vai ter que deixar para trás os pais, os amigalhaços do peito, o Citroen, o gato Xoné e a vidinha que por cá fazia

Pelo facto de me inserir no estranho grupo de pessoas que voluntariamente não vêem e não têm televisão em casa - muito menos a RTPi - confesso não compreender na totalidade o nível de exagero que eventualmente a comunicação social portuguesa dá aos novos emigrantes. Tive de pesquisar no Youtube para visualizar reportagens a compatriotas que se encontram nos aeroportos prestes a embarcar ou que estão desesperados e frustrados com a sua vida pessoal e profissional e naturalmente, dadas as circunstancias, vão ter um discurso ressentido porque estão prestes a deixar "os pais, amigalhaços do peito, o Citroen e o gato Xoné e a vidinha que por cá fazia".

O boi Bocas

A sobranceria neste artigo de opinião é a de alguém que obviamente nunca teve de emigrar ou por ter singrado - seria uma tragédia se houvessem portugueses que não sucedem em Portugal - ou por falta de coragem ou, quem sabe, pelos contactos que tem na lista do telemóvel e que ajudam a muitos que conseguem colocação em algum lugar, vulgo, conhecem o "Senhor Cunha"...



Programa da RTP Linha da Frente: 130.000 portugueses deixaram recentemente o seu país para os mais variados destinados tendo inclusivamente ultrapassado os números da emigração do "salto" nos anos 60 e 70 são índices preocupantes e reveladores de que algo se passa para além de meros Calimeros que se choram e dizem que não regressam mais a Portugal. 

Na empresa onde trabalho, em Łódź, na Polónia, somos cerca de 20 portugueses e o número só tende a aumentar, não só pela procura de quem fale o idioma de Camões mas também de quem fale o de Cervantes, o de Shakespeare, o de Goethe, Rousseau e tantos outros mas sobretudo pela mobilidade que o Espaço Schengen permite aliado uma nova mentalidade que não se limita ao deixar andar, ao ram-ram. Portugal é apenas uma alternativa ao estrangeiro e não o contrário. Muitos desses colegas talvez sejam da tal "Geração lol" que Miguel Sousa Tavares, no seu comentário às praxes, designou como desprovida de valores e que não têm de lutar contra os gorilas e fascistas que a sua geração, por infelicidade, teve. Sim, já somos Democracia desde 1974 e passaram quase 40 anos desde o Golpe de Estado. Os valores mudaram e os meios de comunicar e protestar são outros permitindo uma acomodação que não existia antes do advento da Internet. 

Emigra-se também para mandar bardamerda a incompetência do Estado português, a agonizante bipolaridade entre os partidos de sempre da Esquerda e da Direita, a inimputabilidade da elite financeira, das grandes famílias portuguesas, a roubalheira de ter de pagar as audácias da máfia da alta-finança e da banca e o poder corrompido onde a Maçonaria rege os grandes partidos nacionais alheia a ideais partidários. Emigra-se porque não se querer recorrer - é que não há almoços grátis - à "cunha", ao compadrio... 

Noutras empresas e ramos de actividade na Polónia trabalham especialistas em IT, engenheiros portugueses. Temos também os empresários e empreendedores em actividades tão distintas como o sector imobiliário, de restauração e de venda a retalho e a esmagadora maioria com curso superior.

Felizmente não sou grande amigo destes Calimeros. Acredito mesmo que constituem uma minoria hiperbolizada por alguma comunicação social que adora dar de beber a um povo a salivar por histórias de fracos e oprimidos. Prefiro dar-me com os emigrantes normais. Aqueles que até estavam no “bem bom” ou no “vai-se andando” em Portugal. Mas que decidiram emigrar, porque acharam, e bem, que o país era pequeno para eles. Ambicionaram mais. E partiram com o objectivo de se tornarem ainda melhores.

Atenção emigrantes e futuros emigrantes; cautela e caldos de galinha com os Nunos Ferreiras que ficaram em Portugal, eles estão sem pachorra e julgam-vos sem saberem as vossas histórias de vida. Se estavam no "bem-bom" e no "vai-se andando" em Portugal e emigraram não por necessidade ou sensatez - afinal Portugal é a Land of Opportunity e ainda ninguém reparou nisso - mas porque sim, apenas pretendiam tornar-se ainda melhores então podem regressar descansados nas merecidas férias ou no regresso definitivo que, sabemos, ser pouco provável quando estamos integrados e dominamos o idioma do país de acolhimento.

E quando existem quase 1,5 milhões de licenciados (a que todos os anos se juntam mais 80 mil), não será difícil adivinhar que, num futuro próximo, alguns caixas de supermercado, empregadas da limpeza ou empregados de balcão sejam licenciados. É uma evolução vulgar de Lineu: se caminhamos, e bem, para a educação superior de quase todos, alguns vão ter de fazer o que tem de ser feito e não o que gostariam de fazer.

Se concluíram um curso que não está ajustado à realidade do país o problema é também vosso. Deveriam escolher um curso que "tenha saída" e não um que seja ajustado aquilo que gostam de fazer e para o qual têm talento. Qual a lógica de escolher um curso que se ajuste à nossa vocação? Se não conhecem o "Sr. Cunha" resignem-se a serem caixas de supermercado ou empregadas de limpeza e sobretudo não se queixem publicamente quando tiverem mesmo de emigrar como "saída de emergência" encontrando no regresso ou na partida repórteres no aeroporto de microfone em riste à procura do "furo jornalístico" que capte os momentos de extrema emoção que marcam as despedidas e os reencontros enquanto, num sofá em frente ao televisor, os haters de braços cruzados ambicionam gelatina de morangos... 



1 comentário:

Sansoni7 disse...

Olá
Um post para reflecti...

Cumprs
Augusto